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Mortes de crianças indígenas na fronteira reforçam a necessidade de mudanças nas políticas públicas

A morte de mais uma criança indígena maia da Guatemala sob custódia da Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA exige que os Estados Unidos ajustem sua abordagem e encerrem suas políticas e práticas de imigração desumanas e cruéis, dando atenção especial ao cuidado e tratamento de crianças que buscam asilo na fronteira. Jakelin Amei Rosmery Caal Maquin, de sete anos, uma menina maia Q'eqchi', morreu em 8 de dezembro em um hospital do Texas. Felipe Gomez Alonso era da Nação Maia Chuj; o menino de oito anos morreu na véspera de Natal. 

Essas tragédias também exigem que os Estados Unidos, as agências internacionais e as organizações humanitárias e de direitos humanos examinem atentamente a repressão política em curso, a ilegalidade e o sistema jurídico discriminatório na Guatemala – fomentados por décadas de ajuda e investimentos estrangeiros – que forçam a migração de povos indígenas para os EUA e alimentam a violência e outras terríveis violações dos direitos humanos contra aqueles que permanecem em seus países de origem.  

O Programa Mundial de Alimentos da ONU afirma que “o rosto da fome na Guatemala é jovem, feminino, indígena e rural”. Jakelin Caal Maquin, de sete anos, personifica essa descrição. Relata-se que o pai de Jakelin, um agricultor de subsistência com um pedaço de terra pequeno demais para sustentar uma família, foi para os Estados Unidos em busca de trabalho. Ele levou Jakelin consigo – talvez por ter ouvido dizer que suas chances de permanecer nos Estados Unidos seriam maiores se chegasse com uma criança. 

Para os maias e outros povos indígenas da Guatemala, os direitos à terra não são apenas uma porta de entrada para oportunidades; suas terras e recursos são fundamentais para sua sobrevivência física e cultural. No entanto, décadas de políticas estadunidenses de apoio a regimes repressivos na Guatemala contribuíram para desencadear uma guerra civil de 36 anos que resultou no deslocamento e massacre de centenas de milhares de maias e outros povos indígenas. 

Já se passaram 28 anos desde a assinatura dos Acordos de Paz da Guatemala, que prometiam devolver as terras aos povos indígenas, das quais foram roubadas séculos antes. Mas os povos indígenas ainda lutam por seus direitos territoriais. Hoje, as terras permanecem concentradas nas mãos de poucos. Por exemplo, apenas cinco empresas detêm todas as plantações de óleo de palma do país – incluindo as que ficam ao norte de San Antonio de Cortez, onde o pai de Jackelin teria procurado emprego. Essas plantações ocupam uma área equivalente à utilizada por mais de 60.000 agricultores de subsistência. O povo maia é a maioria da população da Guatemala, composto por 22 diferentes nações indígenas; mas o cenário político e social do país é governado por uma minoria, um apartheid de fato nas Américas.

Os direitos dos povos indígenas à autodeterminação sobre seus territórios, ambientes e recursos naturais têm pouca proteção no arcabouço legal da Guatemala, criando extrema insegurança e vulnerabilidade para esses povos. A falta de segurança jurídica está impulsionando a grilagem de terras, despejos, violência e danos ambientais devido à mineração, à produção de óleo de palma e outras agroindústrias, às barragens hidrelétricas e à exploração madeireira. Até 31 de outubro de 2018, 20 defensores dos direitos humanos e dos direitos indígenas haviam sido assassinados, tornando o país um dos mais perigosos das Américas. 

O Centro de Recursos Jurídicos Indígenas defende políticas mais humanas na fronteira dos EUA e também trabalha para promover o Estado de Direito e os direitos territoriais indígenas na Guatemala. Nosso trabalho para ajudar a comunidade maia Q'eqchi' de Agua Caliente a garantir a titularidade legal de suas terras e recursos pode estabelecer um precedente jurídico importante e profundo para a maioria indígena da Guatemala.  

Com o triste fim de 2018 devido às mortes de Jackelin e Felipe, queremos expressar nossa profunda gratidão a todos vocês pela solidariedade e parceria neste trabalho tão importante e por tudo o que fazem em prol da justiça para os povos indígenas. Muito obrigado.

 

Obra: Massacre em Santiago Atitlán, de Pedro Rafael González Chavajay